segunda-feira, 31 de maio de 2010

Escuridão. Não, mais que isso. Um completo breu.

O aposento é pequeno. As paredes, antes brancas e lisas, estão repletas de desenhos agonizantes. Na porta - simples, cinza -, é possível ver marcas de unhas, do desespero de achar uma saída. Esparramados pelo chão frio, papéis, restos de pó branco e de solidão se misturam a seringas usadas, pequenas poças de sangue e excrementos de ratos. Jogado em meio a tudo isso, deitado, está ele. Contrastando com tudo em volta, a pele extremamente branca de seu peito nu se cola aos ossos. Não há vida em seus olhos saltados. As marcas de cortes e de furos nos braços revelam como ele tem passado os dias. O único som do lugar é o de suas arfadas, tentando captar um ar que não virá.

Ele levanta o braço e pega algo pouco maior que sua mão. Mete a outra dentro de uma pequena caixa e pega mais seis pequenos objetos. Um deles sou eu. Não tenho escolha. Fui criada para isso.

Coloca-nos no lugar. Serei eu a escolhida?

À minha volta, tudo começa a girar.

Puxa o gatilho.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Conto de cantos

Sempre adorei o cheiro de gasolina.

Parado no posto, dentro do carro, com minha mãe ao lado, lembrava-me de minha infância. Nas férias, quando era pequeno, meu pai sempre me levava ao parque, e todas as vezes, sem exceção, parávamos em um posto – sempre o mesmo -, e, assim que ele ia pagar o combustível, eu já sabia o que viria depois. E lá vinha ele, sorriso no rosto, com dois ensolarados quindins nas mãos, comprados na pequena doceria ao lado do posto. No parque, ríamos, jogávamos futebol e sujávamos um ao outro. Depois, exaustos, felizes e imundos, voltávamos para casa, onde havia sempre um chá com bolinhos à nossa espera. A memória era tão forte que quase pude sentir o gosto dos bolinhos no chiclete de menta que mascava. Mas hoje está tudo diferente. No lugar do parque e da doceria, grandes arranha-céus, minha mãe já não tem tempo para os bolinhos e uma das muitas viagens do meu pai não o trouxe de volta.

Percebi que não estávamos mais no posto quando passamos por uma lombada. Minha mãe falava, e, pelo jeito, achava que eu a ouvia há algum tempo:

-... e depois eu vou no shopping ver se acho alguma coisa pra comprar, que eu de TPM. Vai sair hoje? Não quero que você beba muito nem que me acorde quando chegar! Ouviu? E quero que você comece a levantar mais cedo, que eu preciso da sua ajuda. – paramos no sinal – Não estou gostando disso de você acordar às dez todo dia. Não tem que fazer nada pra faculdade?

Saí do carro. Podia sentir o sangue subindo à têmpora. O buzinaço dos carros representava que minha mãe ainda não tinha saído. Não olhei para trás. Nunca olharia.

Virei à esquina e notei a primeira porta à minha direita. Ela representava bem o estabelecimento como um todo: era antiga, suja e malcuidada. A única janela que dava para a rua estava com suas tábuas quebradas e as teias tomavam o lugar dos vidros. Acima da porta, havia a inscrição, em tinta branca: “República dos Bichos”. Isso me instigou e atiçou algo em minha memória, mas não consegui me lembrar completamente. Entrei. Minha alergia à poeira quase não me deixou respirar. O lugar estava abandonado, entulhado, e a pouca luz que entrava não me deixava ver completamente seu aspecto. Saí.

Olhei para o relógio e vi que estava quase na hora da minha aula. Comecei a andar em direção à faculdade, sentindo o nauseante Sol bater em minha nuca, quando trombei com alguém que eu não parei para ver quem era. De minhas costas veio o grito. A voz era de homem. Não olhei para trás. Nunca olharia. Mais um grito. Andei mais rápido. Passei pelos dois quarteirões que faltavam quase correndo.

Chegando à minha sala, sentei no meu lugar habitual, ao fundo.

- Hoje é dia de redação! – disse a professora, com sua voz fina e irritante. – Sim, redação. Vocês escreverão sobre o que sonharam na noite passada.

Não aguentei. Levantei a mão:

- Sonhos? – minha voz saiu rouca – Que sonhos?

Postagem primeira

E aqui vou eu, primeira postagem no meu primeiro blog. Quem diria.

Para esclarecimentos aos aventureiros que vão ler isso aqui - ou não -, ele será sobre, digamos, o que eu estiver com vontade de postar.
Postarei bastantes contos - adoro contos -, e por isso o nome do blog. Eventualmente, colocarei aqui alguns textos maiores sobre coisas diversas, como música, algo de política, talvez até futebol, embora eu não queira tomar o tempo de minha escrita - pelo menos não neste blog - com isso.


Para começar, nada de literatura. Talvez no próximo texto.

Queria falar de nostalgia.
É tão, mas tão estranha. E ao mesmo tempo tão bela.
Revela coisas que não imaginaríamos.

Me pego pensando nela.
É tão... "do nada". Tão sublime.


Chega.
Estou sendo direto demais.
Vocês vão cansar de ler isso, se eu continuar assim.

É, chega.
O próximo texto será de literatura. Um conto, para fazer jus ao nome do blog.

Até ele.